quarta-feira, 3 de junho de 2009

Histórias de uma cidade

Uma senhora de muita idade, daquelas que já passaram em larga escala o prazo de validade mas que insistem em persistir, acompanhada pela sua muleta (claro, queria milagres, não?!), resolve passar a estrada. Resolve passar a estrada numa passadeira, numa zona em que há duas faixas de rodagem para cada sentido (2+2=4). Resolve fazê-lo quando o sinal para os peões está vermelho e o sinal para os automóveis (todos eles) está verde. Ao chegar a meio da segunda faixa olha o horizonte e vê a manada de metal que se achega. Do alto da sua perspicácia e experiência de vida, a senhora reage:

a) segura a muleta em jeito de lança e dispara ao primeiro carro que a mira; vasa uma vista ao condutor;

b) descobre forças onde há muito param teias e corre desenfreadamente pela estrada afora; os condutores aplaudem (enquanto se ouve um taxista buzinar e exclamar “p**a da velha, hein!”)

c) morre de AVC no próprio local; o sangue que lhe escorre da cabeça fracturada provoca três acidentes graves e muita asneirada durante todo o resto da manhã;

d) pára de andar e levanta a mão livre de muleta em jeito de Gandalf; leva poucos segundos a perceber que não conseguirá parar o trânsito com o poder do seu verniz e resolve continuar a caminhar (safa-se por pouco a ser colhida pela manada que já acelerava só pelo prazer de a poder matar e assim libertar todo o stress rodoviário – é que estas coisas dão cabelos brancos e as velhas, as que insistem em sair à rua, são, de facto, uma raça muito ruim!)