terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

Ainda no "Achei que devia.."

AS LEIS FUNDAMENTAIS

Um grupo de sábios judeus reuniu-se para tentar criar a menor Constituição do mundo. Se alguém fosse capaz de definir - no espaço de tempo que um homem leva para se equilibrar num só pé - as leis que deviam reger o comportamento humano, este seria considerado o maior de todos os sábios.
- Deus pune os criminosos - disse um. Os outros argumentaram que isto não era uma lei, mas uma ameaça; a frase não foi aceite.
- Deus é amor - comentou outro. De novo, os sábios não aceitaram a frase, dizendo que não explicava bem os deveres da humanidade.
Neste momento, aproximou-se o rabino Hillel. E, colocando-se num só pé, disse:
- Não faça ao seu próximo aquilo que detestaria que lhe fizessem a si; esta é a Lei. Tudo o resto é comentário jurídico.
E o rabino Hillel foi considerado o maior sábio do seu tempo.

O ARREPENDIMENTO SINCERO
O monge Chu Lai foi agredido por um professor que não acreditava em nada do que ele dizia. Entretanto, a mulher do professor era seguidora de Chu Lai - e exigiu que o seu marido fosse pedir desculpas ao sábio.
Contrariado, mas sem coragem de dizer que não à mulher, o homem foi até ao templo e murmurou algumas palavras de arrependimento.
- Eu não o perdoo - disse Chu Lai. - Volte ao trabalho.
A mulher ficou horrorizada:
- O meu marido humilhou-se, e o senhor - que se diz sábio - não foi generoso!
Respondeu Chu Lai:
- Dentro da minha alma não existe nenhum rancor. Mas, se ele não está arrependido, é melhor reconhecer que tem raiva de mim. Se eu tivesse aceitado o seu perdão, íamos estar a criar uma falsa situação de harmonia - e isso aumentaria ainda mais a raiva do seu marido.

MUDAR A ATITUDE
- Pelo período de um ano, pague uma moeda a quem o agredir - disse o abade a um jovem que queria seguir o caminho espiritual.
Nos doze meses seguintes, o rapaz pagava uma moeda sempre que era agredido.
No final do ano voltou ao abade para saber qual era o próximo passo.
- Vá até à cidade comprar comida para mim.
Assim que o rapaz saiu, o abade disfarçou-se de mendigo e foi até à porta da cidade. Quando o rapaz se aproximou começou a insultá-lo.
- Que bom! - comentou o rapaz. - Durante um ano inteiro tive de pagar, e agora posso ser agredido de graça, sem gastar nada!
Ouvindo isto o abade retirou o seu disfarce.
- Quem não leva os insultos a sério está no caminho da sabedoria.

BEN ABUYAH E A APRENDIZAGEM
O rabino Elisha ben Abuyah costumava dizer:
"Aqueles que estão abertos às lições da vida e não se alimentam de preconceitos são como uma folha em branco onde Deus escreve as suas palavras com tinta divina."
"Aqueles que olham o mundo com cinismo e preconceitos são como uma folha já escrita onde não cabem novas palavras."
"Não se preocupe com o que já sabe ou com o que ignora. Não pense no passado nem no futuro. Deixe apenas que as mãos divinas tracem, a cada dia, as surpresas do presente."

BEGOÑA E O RITMO
- Faltou qualquer coisa à sua palestra sobre o Caminho de Santiago - diz-me uma peregrina assim que saímos da Casa da Galicia, em Madrid, onde minutos antes eu acabara de dar uma conferência.
Deve ter faltado muita coisa, pois a minha intenção ali era apenas partilhar um pouco a minha experiência. Mesmo assim, convido-a para tomar um café, curioso em relação ao que ela considera uma omissão importante. E Begoña - é este o seu nome - diz-me:
- Tenho notado que a maioria dos peregrinos, seja no Caminho de Santiago, seja nos caminhos da vida, procura seguir o ritmo dos outros. No início da minha peregrinação procurava ir junto do meu grupo. Cansava-me, exigia ao meu corpo mais do que ele podia dar, estava sempre tensa, e acabei por ter problemas nos tendões do pé esquerdo. Impossibilitada de andar durante dois dias, percebi que só conseguiria chegar a Santiago se obedecesse ao meu ritmo pessoal. Demorei mais que os outros. Tive de percorrer sozinha muitos trechos, mas só consegui completar o caminho porque respeitei o meu próprio ritmo. Desde então aplico o que ali aprendi a tudo o que tenho de fazer na vida: respeito o meu tempo.

Paulo Coelho